Denominações de Origem e Indicações de Procedência impulsionam a qualidade dos vinhos do Brasil!

As primeiras regiões vinícolas demarcadas do mundo, criadas para garantir a qualidade e origem de seus vinhos, surgiram na Hungria (Tokaji) e em Portugal (Douro – Vinho do Porto) ao longo do século XVIII. Porém, foram necessários quase dois séculos para que essa inciativa se tornasse realmente global.

A partir da criação do INAO (Institut National des Appellations d’Origine), instituído pelo governo francês em 1935, a prática de delimitar e qualificar regiões vinícolas se tornou mais efetiva e serviu de base para que diversos países europeus como a Itália, a Espanha e Portugal passassem a erigir mecanismos de controle semelhantes.

No Brasil, a tradição vitivinícola de qualidade é muito mais recente (tem menos de 50 anos) e apenas em 1996, com a criação da lei de propriedade industrial nº9.279, começou a ser viável traçar os planos para implementar as primeiras indicações geográficas brasileiras deste segmento, mais especificamente na Serra Gaúcha, no Rio Grande do Sul.

O primeiro passo, antes mesmo da promulgação da LPI nº9.279/96, foi a criação da Aprovale (Associação dos Produtores de Vinhos Finos do Vale dos Vinhedos) em 1995. A partir dela, contando com o suporte dado por orgãos governamentais, sobretudo da Embrapa (Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária) de Bento Gonçalves (RS), os produtores da região puderam traçar os parâmetros qualitativos básicos para estabelecer a primeira IP (Indicação de Procedência) de vinhos do país.

Após alguns anos de intensa pesquisa abrangendo a análise dos solos, a qualidade das vinhas e dos vinhos produzidos, a Indicação de Procedência Vale dos Vinhedos conseguiu finalmente ser aprovada no ano de 2002. As normas estabelecidas para essa I.P. passaram a regulamentar a área geográfica dos vinhedos, os tipos de vinhos, as variedades (castas), sistemas de produção, maturação mínima das uvas, produtividade e uma série de outros aspectos. Somente aqueles vinhos que preencheram tais requisitos estavam aptos a receber o selo que os identificavam nas garrafas despachadas ao mercado consumidor.

Passados 10 anos dessa primeira conquista, a I.P. Vale dos Vinhedos continuou em evolução, reposicionando-se a partir de 2012 dentro da categoria D.O. (Denominação de Origem). Ainda que as D.O.’s não sejam legalmente consideradas superiores às I.P.’s, certamente elas são bem mais restritivas e exigentes, sugerindo que a qualidade final dos vinhos tende a ser mais elevada.

Atualmente estão aprovadas e registradas pelo INPI (Instituto Nacional de Propriedade Industrial) seis Indicações Geográficas (I.G.) ligadas ao vinho no Brasil: a D.O. Vale dos Vinhedos e mais as I.P.’s de Altos Montes, Pinto Bandeira, Monte Belo, Farroupilha e Vale da Uva Goethe (situada no estado de Santa Catarina).

Em recente visita a Serra Gaúcha, tive oportunidade de ver bem de perto os esforços envidados pelos produtores de quatro das cinco I.G.’s registradas no Rio Grande do Sul. Na I.P. Farroupilha pude conhecer melhor os vinhos elaborados com as uvas moscatéis, com destaque evidente para suas versões espumantes.

Pinto Bandeira, cuja I.P. abriga vinhos tranquilos e espumantes, deverá migrar (ou subdividir-se) em breve para ser uma nova D.O., voltada especificamente para os espumantes finos elaborados pelo método tradicional (Champenoise). Pelas amostras que degustei nesta visita e em inúmeras ocasiões anteriores, ela segue firme na promessa de consolidar-se na produção dos melhores espumantes desse gênero no Brasil.

Na I.P. Altos Montes, que engloba os municípios de Flores da Cunha e Nova Pádua, há uma grande diversidade de castas e estilos de vinho em elaboração, mas tudo indica que os tintos mais estruturados baseados nas castas Merlot, Cabernet Franc e Marselan deverão prevalecer sobre as demais com o passar do tempo.

Para fechar o circuito das I.G.’s, retornei ao Vale dos Vinhedos, a única D.O. brasileira até o momento. Durante uma palestra sobre as normas vigentes para a elaboração de vinhos naquela região, ficou claro o estreito gargalo estabelecido pelos produtores em busca de atingir o máximo potencial de seu, já podemos dizer, terroir.

Na D.O. Vale dos Vinhedos a casta Merlot foi eleita a base para todos os tintos (seja em versões monocasta ou cortadas com pequenos lotes de Cabernet Sauvignon, Cabernet Franc ou Tannat). Entre as brancas, a Chardonnay é onipresente, ainda que possa ser associada com a Riesling Itálico. Para os espumantes, elaborados apenas pelo método tradicional, também só se admitem as castas Chardonnay, Pinot Noir e, em menor escala, a Riesling Itálico.

Até o presente momento (setembro de 2017), outras quatro áreas estão em fase final de pesquisa e estruturação de novas Indicações Geográficas: a D.O. Altos de Pinto Bandeira e as I.P.’s da Campanha Gaúcha, da Serra Catarinense (SC) e do Vale do São Francisco (BA).

Diante do empenho demonstrado pelos produtores e suas associações, dos vinhos que degustei em cada uma dessas regiões, me parece bastante seguro dizer que o “dever de casa” está sendo bem feito. Acredito que a qualidade dos vinhos brasileiros, sobretudo dos espumantes, vai continuar em trajetória qualitativa ascendente por muitos anos mais, ainda que hajam inúmeros desafios e algumas limitações, que somente o tempo e trabalho dedicado podem superar.

Agora só me cabe desejar a melhor evolução possível para cada uma dessas Indicações de Procedência e Denominações de Origem… Viva o vinho brasileiro!

Créditos dos mapas: Jorge Tonietto (Embrapa – Uva e Vinho – Bento Gonçalves)

Fonte: A Gazeta Online ES